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Showing posts from October, 2011

Da série tenho preguiça de:

3. Críticos que falam mal de um determinado projeto pressupondo que o autor quisesse fazer uma coisa que ele obviamente nunca quis. Assim, você perde seu tempo lendo o sujeito que reclama que um livro de hai-kais é lacônico, que um romance de 1200 páginas é muito longo, que um livro confessional é muito confessional, que um filme de Hollywood é comercial, que uma peça de teatro sem diálogo não tem diálogo etc. A maior das enrolações críticas é julgar um filme do Spielberg pelos parâmetros do Bergman e um filme de Bergman pelos parâmetros do Spielberg: só dá obviedades.

Da série tenho preguiça de:

2. Críticos de qualquer espécie que se propõe a “resumir” um filme/livro pelo método Frankenstein: “o livro X é um Harry Potter chileno com pitadas de Saramago e um clima de comercial de Sempre-Livre.” Uma variação tão terrível quanto é “resumir” um diretor/autor pelo mesmo método, eg “a escritora Y é uma mistura de Clarice Lispetor e Elizeth Cardoso” e, variante ainda mais nojenta, “fulana é um sicrano de saias.”

99%

Agora é oficial: o relatório do Budget Office do Congresso americano revela que a renda do 1% mais rico dos Estados Unidos cresceu 275% nos últimos 30 anos, pulando de 8% em 1979 para 17% da renda total em 2007. Um quinto da população tem mais renda que os outros quatro quintos juntos. Os ricos pagam menos impostos, os pobres recebem menos ajuda.

O ético e o cachorro louco

Em sua última turnê como primeiro-ministro, Tony Blair visita o diabo redimido. Um final melancólico para um governo que chegou ao poder prometendo uma política externa ética...

E no Papai Noel, quem acredita?

[à direita: Em 2003, o marido de Carla Bruni recebeu o tirano para uma visita de cinco dias ao país de Brigitte Bardot . Sarkozy dizia em 2007: "se não abraçamos nações que tomam o caminho da respeitabilidade, que diremos a aqueles que tomam o mesmo caminho na direção oposta?"] [à esquerda: em 2010, diz o The Guardian que o rei da bunga-bunga e o mesmo tirano acertavam visitas de mulheres italianas a Trípoli para conhecer a cultura dos homens líbios de perto .] Espera aí, deixa eu ver se entendi: uma revolução que recebe apoio entusiasmado do ocidente em nome da preservação da convenção de genebra termina com o déspota sendo linchado, assassinato sumariamente e exibido como troféu antes que ele, levado a julgamento, confirmasse detalhes de anos de relações "preferenciais" com a Europa ocidental... E em Papai Noel, quem acredita?

Poesia Americana 3: Claudia Rankine

"Am I dead? Though this question at no time explicitly translates into Should I be dead, eventually the suicide hotline is called. You are, as usual, watching television, the eight-o'clock movie, when a number flashes on the screen: I-800-SUICIDE. You dial the number. Do you feel like killing yourself? the man on the other end of the receiver asks. You tell him, I feel like I am already dead. When he makes no response you add, I am in death's position. He finally says, Don't believe what you are thinking and feeling. Then he asks, Where do you live?" O resto está aqui .

A história brasileira e as ações afirmativas

Trecho da entrevista de Luiz Felipe de Alencastro à Revista da Fapesp : […] de repente tinha 750 mil africanos e os filhos deles, os netos, todos ilegalmente nas mãos de soi-disant proprietários. Mas nenhum desses proprietários foi condenado por sequestro e quase todos os indivíduos livres continuaram a ser mantidos na escravidão. Este é o fato escandaloso, um dos maiores crimes do século XIX, ocorrido no Brasil, que não se ensina nas nossas escolas e faculdades: as duas últimas gerações de escravos no Brasil não eram escravos e estavam ilegalmente mantidos como propriedade de alguém, como cativos. Alguns abolicionistas foram ao tribunal, Ruy Barbosa, Joaquim Nabuco, José do Patrocínio, Luís Gama, e conseguiram libertar uns 500 indivíduos entre as centenas de milhares ilegalmente escravizados. Isso virou um tabu na história do Brasil e hoje pouca gente sabe que a escravidão era não somente imoral, mas era também, e sobretudo, ilegal. José do Patrocínio, em 1880, na Gazeta de

Diário da Babilônia - New Haven Green

Foto da direita de Óscar González A foto da direta mostra o sábado passado no Green de New Haven [a velha praça gramada da época colonial, quando servia de pasto comum]. Ali um grupo ainda pequeno de pessoas se reuniu para protestar contra cortes nos serviços públicos que ajudam uma multidão de gente sem emprego ou sub-empregada, contra um regime que propõe cada vez menos impostos pagos pelos mais ricos e cada vez mais ricos e contra guerras intermináveis terceirizadas a peso de ouro: contra tudo o que faz com que o país mais rico do mundo esteja rumando a passos largos em direção à ruína. Esse mesmo Green estava abarrotado de gente há quarentas anos [foto da esquerda] e não sei se as coisas vão chegar a esse ponto, mas o jogo não é menos importante: fazer com que as pessoas que entendem o que está acontecendo se levantem e coloquem seus votos nas urnas nas próximas eleições presidenciais e do congresso americano. Só assim os Estados Unidos não viverão mais quatro anos de

Civilização e barbárie, ou as aparências enganam

"Nosotros tenemos un código de cartoneros, por ejemplo: no tomar cuando se trabaja, no dejar la calle sucia. Tener en cuenta el vecino, aunque el vecino no le conteste el saludo, uno saludar igual. Ser cordial. Todo eso está escrito y lo respetamos." Depoimento de Virginia Pimentel no livro Cartoneros de Eduardo Anguita, 159.

Poesia Minha - Vida em degelo

Vida em degelo uma aresta gigantesca de gelo emerge do fundo ermo do mar rasga com o corpo o ar frio e seco ajusta-se ao seu leito desigual encara o sol da meia-noite indiferente flutua dura e cega aresta de água e sal dissolvendo-se em regresso é só um fantasma banal do nosso longo epílogo lento uma imensa lápide em branco um Titanic às avessas não há nada por trás do seu silêncio

Entre duas línguas

Antes de junho Olívia só falava inglês. Entendia tudo o que nós dizíamos em português, mas só respondia em inglês, com uma ou outra palavrinha de português adicionada ao vocabulário em conversas conosco. Ela inclusive nos chamava de “mummy” and "daddy" ao invés de mamãe e papai. Em junho fomos passar dois meses e meio em Belo Horizonte e matriculamos Olívia na escolinha do irmão. Ela enfrentou o desafio com uma coragem que me espantou: imagine ser transplantado sem entender porque ou como para um outro planeta onde agora todas as pessoas falam como os seus pais e, tendo em media três vezes o seu tamanho conseguem à sua revelia te abraçar e beijar e pegar, coisas que não aconteciam em absoluto no seu planeta de origem – que simplesmente desapareceu, já que você ainda não entende muito bem a idéia de deslocamento assim no abstrato. Bom, em duas semanas Olívia começou a falar português, ainda inserido em frases em inglês (“I want nadar”, “I like vovó”, etc) e, em

Entre duas línguas

Três trechos interessantes do ensaio biográfico de Saul Bellow que o New York Review of Books acaba de publicar : Sobre identidade: “So, in my first consciousness, I was, among other things, a Jew, the child of Jewish immigrants. At home our parents spoke Russian to each other, we children spoke Yiddish with them, and we spoke English with one another. At the age of four we began to read the Old Testament in Hebrew, we observed Jewish customs, some of them superstitions, and we recited prayers and blessings all day long. Because I had to memorize most of Genesis, my first consciousness was that of a cosmos, and in that cosmos I was a Jew. I suppose it would be proper to apply the word ‘archaic’ to such a representation of the world as I had—archaic, prehistoric. This was my ‘given’ and it would be idle to quarrel with it, to try to revise or efface it.” Sobre a língua materna: “One’s language is a spiritual location, it houses your soul. If you were born in America a

O santo e a fábrica de suicídios

Antes de escrever mais um epitáfio sentimental sobre Steve Jobs, pergunte-se: de onde saiu o seu bonito iPad e o meu lustroso iMac? Das mãos de gente que faz, em média, 120 horas extras mensais, trabalhando uma semana de 70 horas, ou seja 10 horas por dia o ano inteiro sem domingo ou feriado. O salário mensal: 250 reais, dependendo ainda da produtividade. Longe de casa, 300.000 trabalhadores comem e dormem na fábrica. Resultado: uma epidemia de suicídios. A fonte é o jornal CONSERVADOR Daily Telegraph ... Não se trata aqui de demonizar Steve Jobs ou a Apple, mas de dar contorno mais bem definido ao "milagre chinês" [não é por acidente que uso aqui o termo que se aplicou ao Brasil de Médici] e sua relação íntima com o "milagre tecnológico" da economia supostamente "pós-industrial" da . Somos um organismo esquizofrênico, de um lado caminhando a passos firmes no século XXI e do outro chafurdando no atoleiro do século XIX. Não é irônico que os 300.000 chineses

E 2 palitos sobre censura [o óbvio ululante, outra vez)

Impressionante também o número de pessoas na internet que são "contra qualquer tipo de censura". Como se toda a censura fosse necessariamente patrocinada pelo governo. Ninguém considera, por exemplo, as restrições econômicas à livre expressão que controlam com mão de ferro o acesso às salas de cinema e à televisão no mundo todo. E há que lembrar também que a auto-censura é um princípio fundamental da vida em comunidade. Se vejo minha vizinha sair de casa e acho o carro dela horrível, tenho que ser capaz de me conter e não dizer nada a ela. Algumas pessoas por aí parece que têm incontinência verbal e depois não querem nem pegar o paninho para limpar a sujeira que fizeram fora do vaso (que aliás, não por acaso, também é conhecido por privada ) . É meu direito criticar o mal gosto da minha vizinha com na minha vida privada . Aliás, no aconchego do meu vaso e com a porta trancada eu tenho direito de ser racista, machista e escroto. Da porta de casa para fora ou conectado à intern

Problemas de privacidade

Muita gente reclamou das mudanças no fcbk, alguns até se retiraram em protesto. Ninguém tem que gostar de mudanças em lugar nenhum, mas estranhei quando algumas pessoas falaram em desrespeito à privacidade. Acho que as pessoas ainda não entenderam que a internet é um espaço público. Comunicações privadas deviam ser feitas por email - talvez nem assim, dependendo do conteúdo. O pessoal fica pondo fotos comprometedoras e falando as mesmas abobrinhas que fala na mesa do bar na internet e depois fica queimado?